Observações de Angel Gurría,
Secretário-Geral, OCDE
6 de fevereiro de 2017
Lisboa, Portugal
(conforme preparado para entrega)
Ministro Mário Centeno,
Embaixador Pinheiro,
Senhoras e senhores,
É com grande prazer que me encontro em Lisboa para apesentar o mais recente Estudo Económico de Portugal da OCDE. O presente estudo é lançado num cenário de incerteza a nível mundial. A economia mundial tropeça nos 3%, o crescimento do comércio é lento e deparamo-nos agora com uma reação contra a globalização em vários países da OCDE. Os níveis de confiança estão a cair, ao passo que a desigualdade dos níveis de riqueza e dos rendimentos continua a aumentar. Os países têm de traçar um caminho para uma globalização mais justa e mais inclusiva.
Pese embora os desafios colocados por este cenário, a economia portuguesa tem vindo a recuperar gradualmente de uma profunda recessão com o apoio de um amplo programa de reformas estruturais. Por exemplo, assistimos a importantes reformas nos mercados de trabalho e dos produtos, na política fiscal, em matéria da concorrência e no setor público. Reformas estas que deram os seus frutos. A economia portuguesa está a crescer, a taxa de desemprego está a baixar e houve um sólido progresso na dinamização dos resultados das exportações. As exportações de Portugal totalizam agora mais de 40% do PIB, em comparação com os 27% registados em 2005. Esta conquista ajudou a inverter os desequilíbrios externos, e o défice da balança de transações correntes, a que se assistia há já muitos anos, transformou-se num excedente.
O panorama das finanças públicas de Portugal é igualmente animador. Prevê-se que o défice orçamental de Portugal de 2016 fique pela primeira vez dentro dos limites de Maastricht e significativamente abaixo de 3% do PIB. Ainda mais importante é o facto de se prever que o saldo orçamental primário de Portugal terá passado a excedente em 2016, algo que acontece pela primeira vez em 25 anos. Este é um feito grandioso, relativamente ao qual temos de demonstrar o nosso reconhecimento à liderança do Primeiro-Ministro António Costa e do Ministro Mário Centeno.
Senhoras e senhores,
A principal mensagem que hoje queremos veicular é que este ímpeto reformista de Portugal tem de continuar. São muitos os problemas ainda pendentes. Muito trabalho de casa para fazer. O endividamento público e privado é muito elevado e o setor bancário continua frágil. A produtividade do trabalho em Portugal continua a ser baixa em comparação com a média, quer da OCDE quer da UE. Também as baixas competências e qualificações, não só travam a produtividade, como constituem um obstáculo à redução da desigualdade na distribuição dos rendimentos.
É necessária uma nova onda de reformas para fomentar o crescimento, a produtividade e, em última instância, o bem-estar dos portugueses. O Estudo de 2017 da OCDE destaca três áreas prioritárias onde é necessário tomar medidas: reduzir a vulnerabilidade da economia e torná-la mais inclusiva; aumentar o investimento; e aumentar as competências e qualificações. Permitam-me comentar cada uma destas prioridades.
Temos de combater as vulnerabilidades persistentes da economia portuguesa. A percentagem de crédito malparado existente nos bancos em Portugal – atualmente cerca de 12% de todos os créditos concedidos – é a quarta mais elevada da área do Euro. Esta situação é preocupante na medida em que prejudica a estabilidade do setor financeiro e deixa a economia vulnerável, aumentando também os riscos orçamentais. Maiores dificuldades no setor bancário colocariam em perigo os esforços envidados para reduzir a dívida pública de Portugal. São necessários mais incentivos regulamentares para os bancos anularem as dívidas nos seus saldos, para agilizar os processos de insolvência, e para desenvolver o mercado de dívida de cobrança duvidosa.
Portugal regista a mais desigual distribuição de rendimentos na Europa. Estão agora a ser tomadas medidas para reduzir a desigualdade e a pobreza. Recentemente, as autoridades portuguesas envidaram esforços para aumentar o regime do rendimento mínimo garantido, medida que se aplaude. Estas alterações irão provavelmente atenuar a pobreza entre as crianças e os jovens, que são quem mais sofreu com o aumento da pobreza em consequência da crise. A desigualdade pode igualmente ser reduzida, se Portugal alargar a cobertura das prestações de desemprego e as tornar independentes da idade – uma recomendação que efetuámos quando lançámos o Estudo Económico de Portugal de 2014. Portugal pode também fazer mais para combater o elevado nível de dualidade existente no mercado de trabalho – isto é, a segmentação entre contratos de trabalho a termo e contratos de trabalho sem termo – e o fosso na proteção que cada um destes fornece aos trabalhadores.
O segundo desafio é o investimento. No rescaldo da crise económica, o investimento caiu de forma acentuada e continua a estar mais de 30% abaixo dos níveis de 2008. O stock de capital de Portugal está gasto e o potencial de crescimento da economia diminuiu. Esta é uma questão que tem de ser resolvida com urgência.
Uma rápida resolução para os créditos de cobrança duvidosa será benéfica, mas muito mais pode ser feito. Os incentivos a novos investimentos de capitais podem ser reforçados através de melhorias ao nível da eficácia judicial e de reformas da regulamentação dos mercados de produtos, bem como através de esforços para reduzir os encargos administrativos. A considerar como prioridade deve também ser a abertura a novas fontes de financiamento – em especial para as PME. A OCDE orgulha-se em estar a colaborar com as autoridades portuguesas numa avaliação em matéria de concorrência que ajudará a melhorar o tecido empresarial e a estimular a criação de novas empresas.
Melhorar as competências e qualificações é outro importante desafio para Portugal. Portugal registou uma acentuada evolução na melhoria dos resultados do ensino, com os valores de PISA a situarem-se agora na média ou acima da média da OCDE. Apesar deste avanço, comparando com outros países europeus, os cidadãos portugueses são em média pouco qualificados. São necessárias medidas ambiciosas para aumentar os níveis de competências e qualificações da população adulta. São igualmente necessárias outras melhorias ao nível do sistema de ensino para resolver o problemas das qualificações entre os jovens atuais.
O nosso relatório recomenda que seja dada especial atenção a uma redução na elevada percentagem de abandono escolar, que se situa perto dos 14%, sendo a quarta mais elevada da UE. O problema da reprovação escolar tem também de ser resolvido. Mais de um terço dos alunos portugueses repetiu o ano escolar pelo menos uma vez até aos 15 anos de idade. São também necessários esforços acrescidos para avaliar e reforçar o sistema de ensino e formação profissional em Portugal.
Senhoras e senhores,
Hoje, tenho a honra de anunciar o lançamento da segunda e última fase da parceria da OCDE com Portugal relativamente à estratégia nacional de qualificações e competências. Em 2014 e 2015, a OCDE colaborou estreitamente com as autoridades portuguesas num diagnóstico dos problemas que Portugal apresenta nesta matéria. Os nossos especialistas passaram meses a envolver um amplo leque de partes interessadas, tendo identificado 12 domínios onde Portugal apresenta problemas. É tempo agora de passar do diagnóstico à ação, de converter a nossa análise dos problemas em termos de qualificações e competências de Portugal em ações que melhorem a produtividade e que ajudem a combater algumas das desigualdades a que me referi anteriormente. Mais tarde, terei a oportunidade de debater o projeto com o Primeiro-Ministro António Costa. E sexta-feira, uma equipa de especialistas, liderada pelo Diretor para a Educação da OCDE, irá reunir com representantes de diversas áreas do Governo para começar a trabalhar neste importante projeto. Este é um dos diversos modos em que a OCDE se encontra a colaborar com Portugal e em prol de Portugal.
Ministro Mário Centeno, caros amigos: Portugal trilhou o caminho para um futuro mais auspicioso com este programa de reformas. Precisa agora de preservar este ímpeto. Podem confiar que a OCDE continuará a colaborar com Portugal e em prol de Portugal com o intuito de conceber, desenvolver e fornecer melhores políticas para melhores vidas.
Muito obrigado.
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